IDH: sem solução para nosso problema civilizatório? (da Folha SP 12/12/19)

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Esqueça a posição 79odo Brasil no IDH. O número mais importante desse ano é a perda de 23 posições do país no ranking do IDH, quando as médias são corrigidas pelo grau de desigualdade nas diferentes dimensões do desenvolvimento humano. A má distribuição da renda ocasiona 36.7% dessa perda. Mas não é o fator que explica a mudança no ranking. O que mudou esse ano foi a piora na distribuição na educação, que foi de 22% ano passado para 23.8%. Esqueça a posição geral do Brasil no ranking do IDH; olhe o que está acontecendo com a distribuição da educação no Brasil, entre regiões, entre escolas públicas e privadas, entre os que podem estudar e os que não. Mas o crescimento econômico não poderia corrigir isso?

Não; esqueça. O  crescimento econômico não vai resolver sozinho o problema da educação ou da pobreza no Brasil. Em um país onde o 1% mais rico ganha 28.3% da renda nacional e os 10% mais ricos tem 42%, não há como o crescimento econômico ser um efetivo instrumento de transformação social. Similarmente, em um país onde a renda nacional dos homens é 71% mais alta do que a das mulheres, é bem mais difícil para elas usufruírem dos benefícios do crescimento econômico. Esqueça o crescimento econômico. Mas não se poderia resolver esses problemas através de uma melhoria da distribuição de renda?

Não; esqueça também que a distribuição vai melhorar, pois só piora. Medindo por onde seja há uma piora na distribuição de renda que está levando os pobres à níveis indescritíveis de indignidade humana e empobrecendo a classe média mais rapidamente do que essa pensa. De fato, o índice de Palma, que mede a razão entre a renda dos 10% mais ricos e a dos 40% mais pobres, aumentou de 3.5 para quase 4 vezes nesse último ano. Além disso, o índice de Gini, que é sensível à variações no meio da distribuição de renda, sinaliza uma piora de 51.3 para 53.5 em apenas um ano. Isso significa que a classe média está sendo apertada. A distribuição de renda não vai melhorar por passe de mágica, olhe para os impactos perversos da polarização econômica na nossa democracia. Mas a política não poderia resolver isso?

Não; esqueça que a política nacional é solução para algo. A política segue à reboque de assimetrias de poder encravadas em uma estrutura econômica fortemente excludente, que alimentam interesses próprios e fantasias de mudança social como estratégia de manutenção do poder. Às vésperas de transformações tecnológicas que irão mudar o panorama do emprego no mundo, o que faz o Brasil? Intensifica o seu modelo excludente. Esqueça que a política nacional é solução para a economia ou para a sociedade. Parece que não há como fugir: precisamos, cada um a seu jeito, encarar de frente que não há solução óbvia para nosso problema civilizatório. Olhar para nossas desigualdades pode ser contudo um começo.

 

 

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